quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Esfera Celeste

Observando o céu em uma noite estrelada, não podemos evitar a impressão de que estamos no meio de uma grande esfera incrustrada de estrelas. Isso inspirou, nos antigos gregos, a idéia do céu como uma Esfera Celeste que será o assunto que iremos tratar.
Há dois aspectos das observações astronômicas que complicam consideravelmente sua interpretação. Um deles é o fato de que os corpos celestes observados são muito distantes da Terra, mesmo os mais próximos, de modo que usualmente só conseguimos enxergar pontinhos luminosos muito parecidos com estrelas, e quando falamos de sua “posição”, referimo-nos em geral à direção em que são observados, sem uma esfera de raio muito grande, como que se tratasse de pontos sobre a superfície dessa esfera.
A outra complicação é devida ao movimento de rotação da terra em torno do seu eixo. Somos observadores sobre uma espécie de plataforma girante, como um carrossel, e os movimentos aparentes dos corpos celestes vistos da terra refletem este movimento de rotação.

A fig.Acima mostra a esfera celeste, que é a esfera de enorme raio sobre a qual projetamos as posições observadas dos corpos celestes, com seus pólos norte e sul (PN e PS), projeções dos pólos correspondentes da terra, e o equador celeste, projeção do equador da terra sobre a esfera celeste. Consideremos um observador O’ na Europa, a cerca de 45° de latitude norte, e o plano horizontal correspondente (tangente à Terra em O’), bem como sua projeção sobre a esfera celeste, o plano do horizonte. A figura mostra os pontos cardeais do observador nesse plano, N, S, E e W. A direção N, por exemplo, é aquela em que O’ se deslocaria para ir em direção ao pólo norte da Terra. A Terra gira em torno de seu eixo (direção PS – PN) no sentido anti-horário. Note que somente corpos celestes situados sobre o equador celeste se erguem ao leste verdadeiro do observador e se põem exatamente a oeste.
Em seu movimento circular aparente diário sobre a esfera celeste, o Sol não retorna exatamente ao ponto de partida após 24 horas. Isto pode ser observado a cada por de Sol, quando as estrelas aparecem: cada noite, o Sol terá se deslocado aproximadamente 1° (cerca de 2 vezes seu diâmetro aparente) em relação às estrelas vizinhas do horizonte, descrevendo outro círculo (360°) na esfera celeste em um ano.
Este círculo, que representa a órbita aparente do Sol na esfera celeste quando descontamos eclíptica, e é descrito no sentido anti-horário (oposto ao do movimento aparente diurno), ou seja, cada dia o Sol se põe um pouco mais ao leste. O plano da eclíptica está inclinado de aproximadamente 23 ½° em relação ao equador celeste, e corta o plano do equador nos pontos D e Ύ. Os dias em que o Sol está nesses pontos da eclíptica são os dois únicos dias do ano em que ele se ergue exatamente a leste e se põe exatamente a oeste. São também os dias em que o Sol passa tempos exatamente iguais acima e abaixo do horizonte, ou seja, em que a duração do dia é igual à da noite. São os dias 21 de março (Ύ) e 22 de setembro (Ω), que correspondem aos equinócios (no hemisfério norte, o primeiro é o da primavera e o segundo o de outono; no hemisfério sul, é o contrário).
O ponto Ύ, que se chama o 1° ponto de Áries (a notação corresponde ao símbolo do Zodiaco), define o análogo do meridiano de Greenwich para a esfera celeste. O análogo da latitude chama-se declinação e varia de 0/ a + 90° (PN) ou – 90° (PS); o análogo da longitude se chama ascensão reta, e varia de 0° a 360° a partir de Ύ.
Há 5 planetas visíveis a olho nu, conhecidos desde a mais remota antiguidade: Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno. A palavra “Planeta” se origina de uma palavra grega que significa “errante”; a razão é que, como o Sol e a Lua, os planetas descrevem órbitas aparentes adicionais sobre a esfera celeste depois de descontado o movimento diurno. Essas órbitas, que geralmente não se afastam muito do plano da eclíptica, são também descritas geralmente em direção ao leste, ou seja, no sentido contrário ao do movimento diurno (como no caso do Sol). São órbitas fechadas, e o tempo que o planeta leva para voltar ao ponto de partida (visto da Terra!) chama-se o período sinódico correspondente: para Mercúrio, é da ordem de 3 meses; para Júpiter e Saturno, é de pouco mais de um ano.
Ao contrário da eclíptica, as órbitas aparentes dos planetas podem se afastar bastante das órbitas circulares descritas com movimentos aproximadamente uniformes. Em certas épocas (para Mercúrio, 3 vezes por ano), o planeta tem um movimento retrógrado, ou seja, “volta para trás” (oeste), descrevendo uma espécie de laço. A idéia mais simples e provavelmente a mais antiga sobre o movimento aparente das estrelas é de imaginar que a esfera celeste seja uma esfera matéria, à qual estão presos os corpos celestes, e que se encontra em rotação uniforme em torno da Terra. Entretanto, este modelo não explicaria o movimento irregular dos planetas.
No princípio do século IV A.C., Platão propôs a seus discípulos um problema que teve grande influência no desenvolvimento posterior das teorias sobre o sistema solar: “Quais são os movimentos uniformes e ordenados cuja existência é preciso supor para explicar os movimentos aparentes dos planetas?” A idéia de Platão era de que todo o Universo deveria ser explicável em termos de formas e figuras “perfeitas”, como círculos e esferas, e de movimentos uniformes.
Enquanto se tratava somente do movimento aparente diurno das estrelas, bastava imaginar uma “esfera terrestre” fixa e uma “esfera celeste” concêntrica, girando uniformemente em torno da primeira. Entretanto, para explicar o mesmo tempo os movimentos aparentes diurno e anual, por exemplo, para o Sol, segundo o programa Platônico, isso não bastava. Eudoxo, discípulo de Platão, imaginou um sistema muito engenhoso; em lugar de duas esferas apenas, haveria diversas “esferas celestes” homocêntricas, presas umas às outras de tal forma que lhes permitisse girar em torno de eixos diferentes (inclinados entre si) com movimentos uniformes de velocidades diferentes, como no sistema de suspensão de um giroscópio. Assim, para o Sol, a esfera a qual o sol estaria preso, giraria solidariamente com a extrema, com seu eixo inclinado em relação ao dela, mas ao mesmo tempo giraria em torno dele, correspondendo à rotação anual (eclíptica). Para um planeta, haveria 3 ou 4 esferas, com eixos de inclinação diferentes e com velocidades diferentes, o que permitia reproduzir inclusive os movimentos retrógrados.
Eudoxo aparentemente não pensava em suas esferas como objetos físicos reais, considerando-as apena como artefatos matemáticos. Entretanto, Aristóteles interpretou-as como objetos materiais (“esferas cristalinas”), chegando finalmente a um gigantesco mecanismo formado por 55 esferas, todas movidas pela mais externa (o “Motor Primário”). Um sistema desse tipo serviu de base ao esquema do Universo descrito por Dante na “Divina Comédia”.

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